O DIREITO À DANOS MORAIS NAS SEPARAÇÕES E DIVÓRCIOS LITIGIOSOS

 

ALESSANDRO MEYER DA FONSECA

 

O casamento possui efeitos tanto na ordem pessoal, como ordem social, quanto de ordem patrimonial, sendo que dos efeitos do casamento decorrem certos direitos e deveres, tendo os cônjuges como titulares deles e devem exercê-los conjuntamente.

 

Estes deveres recíprocos estão especificados no art. 1566 do Código Civil

 

“Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:

I - fidelidade recíproca;

II - vida em comum, no domicílio conjugal;

III - mútua assistência;

IV - sustento, guarda e educação dos filhos;

V - respeito e consideração mútuos.”

 

Qualquer violação dos deveres constantes no art. 1566, do Código Civil, autoriza o inocente, que não concorreu para sua prática, a requerer a separação, por se tornar insuportável a vida em comum, e, eventualmente, a requerer danos morais.

 

O instituto da responsabilidade civil, e mais especificamente da indenização por danos morais pode ser aplicado a todos os ramos do direito, não havendo razão para não ser aplicado no direito de família.

 

A reposta do direito das obrigações ao anseio não atendido pelas regras do direito de família, é uma indenização pela dor, pela angústia e pelo sofrimento, toda vez que a causa da dissolução do vínculo matrimonial tenha relevância e cause grave humilhação e ofensa contra um dos cônjuges.

 

A responsabilidade civil a ser aplicada nos casos de separação ou divórcio pelo descumprimento das obrigações do matrimônio, assim, como em qualquer caso, exige a demonstração dos seguintes pressupostos:

a) ação ou omissão do agente; b) ocorrência de dano; c) culpa e d) nexo de causalidade

 

Ocorrendo todos os pressupostos necessários para a caracterização da responsabilidade civil, o cônjuge causador do dano poderá ser obrigado a indenizar o cônjuge sofredor dos danos morais, pois, sendo o cônjuge inocente um indivíduo que é titular de direitos de personalidade, estes não podem ser impunemente atingidos.

 

Assim, nada mais justo do que se compensar a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do cônjuge inocente, causando-lhe dor, sofrimento, angústia e desequilibro em seu bem-estar e a sua integridade psíquica, até como forma de reprimir a sua ocorrência.

 

A função do processo indenizatório, também se insere a função preventiva ou social, pois desaconselha o autor do dano, o cônjuge descumpridor das obrigações matrimoniais, a não repetir a conduta no futuro, gerando nele um processo de conscientização, e produzindo imediatos reflexos sociais.

 

A obrigação de reparar o dano, ainda que exclusivamente moral, e até mesmo nas relações de família, em especial nas separações e divórcios litigiosos, é previsto nos seguintes artigos da nossa legislação:

 

a) Nos art 5º, V e X art. 226, §§5º e 8º, CF, onde consta o dever do Estado assegurar os mecanismos para impedir a violência, tanto física quanto moral, no âmbito das relações de família, não esquecendo, também, do art 1º, III, CF  que dispõe expressamente sobre a dignidade da pessoa humana.

 

b) Na legislação infra constitucional, ressaltamos os arts. 186 e 927, do Código Civil, que podem e devem ser utilizados nos casos de graves violações dos deveres do casamento.

 

 

Apesar da legislação supra mencionada ser adequada para a responsabilização por danos morais do cônjuge culpado por graves violações dos deveres matrimoniais, cumpre ressaltar que está em andamento no Congresso nacional o Projeto de Lei nº 6.960/2002, para que se adicione o §2º ao art. 927 do Código Civil, e que terá a seguinte redação

 

“Art. 927 (...)

§2º. Os princípios da responsabilidade civil aplicam-se também às relações de família”

 

 

Em relação ao tema em comento, Aguiar Dias, lecionando acerca da violação dos deveres do casamento ensina que “A violação dos deveres explícitos ou implícitos do casamento constitui ofensa a honra e a dignidade do consorte, caracteriza a injúria grave, e, por conseguinte, pressuposto autorizador da separação judicial. (...) ensejando a reparação dos danos meramente patrimoniais, como também dos danos morais” (1)

 

Nessa mesma linha de pensamento, Carolina Valença Ferraz ressalta que “o fim da sociedade conjugal com base no descumprimento dos deveres matrimoniais gera a obrigação de reparar em face da presença dos pressupostos da responsabilidade civil: ato ilícito, nexo de causalidade e dano’(2)

 

Assim, apesar de ainda haver Projeto de Lei nº 6.960/2002, que expressamente aplicará os princípios da responsabilidade civil  às relações de família, acredito que a legislação atual é suficiente para se garantir a devida reparação por danos morais ao cônjuge inocente em divórcio ou separação litigiosa que sofreu dor, sofrimento, angústia e desequilibro em seu bem-estar e a sua integridade psíquica em razão do ato culposo do cônjuge descumpridor dos deveres e obrigações matrimoniais.

 

Corroborando os argumentos acima expostos citamos a recente decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, condenando-se a ex-mulher a indenizar o ex-marido em razão do descumprimento dos deveres conjugais, decisão ainda não publicada, onde o ex-marido pediu a condenação da ex-mulher e de seu amante por danos morais e materiais suportados em razão do descumprimento do dever conjugal de fidelidade, bem como da longa omissão de que os dois filhos por ele criados, nascidos na constância do casamento, eram efetivamente filhos biológicos do amante da ex-mulher (3)

 

No sentido de que a infração dos deveres conjugais podem gerar o dever de indenização citamos os julgados abaixo:

 

TJ/SP – Apelação Cível nº 272.221.1/2, 6ª Câmara de Direito Privado. DJ: 10/10/1996;

TJ/RJ – Apelação Cível nº 2002.001.08987, 4ª Câmara Cível. DJ: 01/10/2002;

TJ/SC – Apelação Cível nº 2004.012615-8, 2ª Câmara Cível. DJ: 05/05/2005;

 

 

Bibliografia:

 

(1) AGUIAR DIAS, José. Da responsabilidade civil. V.1. Ed.Forense,  Rio de Janeiro

 

(2) FERRAZ, Carolina Valença. A responsabilidade civil por dano moral e patrimonial na separação judicial. São Paulo: PUC, 2001.

 

(3) Site: www.espacovital. Acesso em 09.11.2007

 

Artigo embasado na monografia de graduação do discente Rinaldo Dias Bossa

 

 

*ALESSANDRO MEYER DA FONSECA
OAB/MT Nº 7057
Advogado, formado em direito pela UFMT, especialista em Processo
Civil, pós-graduando em Direito Ambiental e professor universitário.